O MPF (Ministério Público Federal) ajuizou ação civil pública contra o presidente Jair Bolsonaro e ministros por considerar que estes tiveram “postura estatal inadequada” no tratamento de assuntos relativos às mulheres.
A ação ( íntegra-2MB) foi protocolada por Pedro Antonio de Oliveira Machado, procurador da República, e Lisiane Braecher, procuradora Regional dos Direitos do Cidadão.
Segundo eles, desde o início da atual gestão, integrantes da cúpula do governo Bolsonaro deram declarações e foram responsáveis por atos administrativos que revelam 1 viés preconceituoso e discriminatório contra o público feminino, reforçando estigmas e estimulando a violência. As falas, segundo o MPF, configuram abuso da liberdade de expressão.
Na ação, os procuradores pedem à Justiça Federal o bloqueio imediato de pelo menos R$ 10 milhões no orçamento federal e que obrigue União a usar este recurso para promover campanhas de conscientização sobre os direitos das mulheres com veiculação em 1 período de 1 ano. Os conteúdos deverão expor os dados sobre a desigualdade de gênero no Brasil e a vulnerabilidade das mulheres à violência, além de reforçar informações sobre os direitos que elas têm ao atendimento nas áreas de saúde, segurança e assistência social. O objetivo seria o de reparar danos sociais e morais coletivos causados pelas atitudes de Bolsonaro e seus ministros.
O MPF ainda solicita que a União seja condenada ao pagamento de R$ 5 milhões ao Fundo de Direitos Difusos, a título de indenização por danos sociais e morais coletivos.
“É desolador que mensagens e pronunciamentos de Ministros do Poder Executivo Federal, que com absoluta falta de sensibilidade, minimizem o grave problema da violência contra a mulher e reforcem, com potencial de perpetuar ou de dificultar sobremaneira o combate ao preconceito contra as vítimas mulheres, mensagens que partindo de autoridades do topo da administração pública federal, impõem inegáveis danos morais coletivos e danos sociais”, afirmam no documento.
Segundo Pedro Antonio de Oliveira Machado e por Lisiane Braecher, são muitos os episódios em que o presidente se dirigiu a mulheres de maneira desrespeitosa ou fez insinuações misóginas. Eles citam o caso de insulto feito à jornalista Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S.Paulo, em fevereiro de 2019. Na ocasião, Bolsonaro fez uma insinuação com conotação sexual ao dizer que a jornalista “queria dar o furo” –entre repórteres, o jargão “dar 1 furo” significa publicar uma informação antes dos concorrentes.
Os procuradores também recordam quando, em abril de 2019, o presidente, na tentativa de refutar que o Brasil seria lugar do que chamou de “turismo gay”, falou: “Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade”. O MPF cita ainda quando, em 6 de julho, Bolsonaro referiu-se ao país como “uma virgem que todo tarado de fora quer”.
Além das declarações de Bolsonaro, os procuradores afirmam que “o descaso do presidente” em relação às mulheres também é evidenciado em ações do governo que vêm dificultando o cumprimento dos direitos femininos. A exemplo, eles citam a revogação de uma nota técnica do setor de Coordenação da Saúde da Mulher, vinculado ao Ministério da Saúde, em junho, assim como a exoneração dos servidores que a assinaram. O texto recomendava a continuidade de ações de assistência durante a pandemia, como o acesso a métodos contraceptivos e a realização de abortos em casos previstos na legislação. “No que depender de mim, não terá aborto”, afirmou o presidente ao justificar a decisão.
Em relação aos ministros, os procuradores citam quando, em setembro de 2019, o ministro da Economia, Paulo Guedes, endossou os ataques que Bolsonaro havia proferido contra a mulher do presidente francês Emmanuel Macron, Brigitte Macron, ao chamá-la de “feia”.
Também mencionam quando o chanceler Ernesto Araújo afirmou que críticas e denúncias referentes a abusos sexuais teriam fundo ideológico, em audiência na Câmara dos Deputados em agosto de 2019.
Além disso, citam declarações da ministra Damares Alves (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos). Em abril do ano passado, em evento na Câmara dos Deputados, a ministra disse que os homens são superiores nas relações matrimoniais e atribuiu esse entendimento à religião. “A mulher deve ser submissa. Dentro da doutrina cristã, sim. Dentro da doutrina cristã, lá dentro da Igreja, nós entendemos que um casamento entre homem e mulher, o homem é o líder do casamento”, afirmou.
Eis uma imagem divulgada pelo MPF com falas do presidente e de ministros consideradas misóginas pelos procuradores:
“Este padrão presente em tais pronunciamentos, assim como outras declarações veiculam estereótipos que reforçam abusivamente a discriminação e o preconceito, que estigmatizam as mulheres. Causam danos morais coletivos e danos sociais, pois atingem todas as mulheres, impactando negativamente o exercício da missão constitucional (que é indeclinável no agir dos dirigentes estatais) de modificar esse quadro de desigualdade social e de discriminação, através da promoção da cidadania e da dignidade humana”, argumentam os procuradores na ação.
Poder 360.