Rio de Janeiro contrariou recomendação do Ministério da Saúde, orientando Pfizer na 2ª dose, mas especialistas questionam decisão
Grávidas que tomaram a primeira dose da vacina contra covid-19 da AstraZeneca não podem receber a segunda, conforme orientado pelo Ministério da Saúde. A recomendação foi feita em maio, depois que uma grávida morreu em decorrência de trombocitopenia associada à vacina. Contrariando essa indicação, a prefeitura do Rio de Janeiro autorizou, na terça-feira (29), o uso da vacina da Pfizer como segunda dose. Como ficam as grávidas do resto do país?
A decisão local vai contra a orientação do PNI (Programa Nacional de Imunizações), que não recomenda a intercambialidade de vacinas na imunização contra a covid-19, ou seja, que o esquema vacinal seja realizado com imunizantes diferentes. A prefeitura aponta que se apoia no uso praticado em outros países.
O pediatra infectologista Renato Kfouri, presidente do Departamento de Imunizações da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), ressaltou, durante o Fórum “Imunização em gestantes e lactantes no contexto da Covid-19”, realizado na terça-feira (29) pelo Ministério da Saúde, que apenas gestantes que se vacinaram com CoronaVac devem completar o esquema vacinal.
“Vacinas inativadas, pelo que já conhecemos, são vacinas seguras para serem aplicadas (…) Apesar de não haver estudos [sobre o uso das vacinas em gestantes], eventualmente o risco pode justificar seu uso em uma grávida. A pandemia já justifica cogitarmos esse uso”, afirmou.
Aquelas que receberam a primeira dose da AstraZeneca, hoje uma vacina contraindicada na gravidez, devem terminar esse esquema só 45 dias após o parto, segundo ele. “Essa é uma decisão constantemente revista, que pode mudar em face de novos estudos. A própria Febrasgo [Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia] vem debatendo essa questão. O que é maior risco: fazer intercâmbio de vacina durante a gestação ou deixá-la desprotegida até o final, desprotegida com proteção parcial de uma única dose, se ela fez AstraZeneca na primeira dose?”, questionou.
O Ministério da Saúde frisa que grávidas devem completar o esquema vacinal independentemente do intervalo entre as doses. Nesse sentido, A imunologista Lorena de Castro Diniz, da Asbai (Associação Brasileira de Alergia e Imunologia), explica que há estudos recentes sobre os benefícios da aplicação das doses da AstraZeneca com um intervalo maior do que o recomendado na bula, que é de três meses. “Esse estudo confirmou que é até melhor o distanciamento entre as doses”, afirma. A pesquisa se refere ao uso com 10 meses de intervalo.
“As que não tomaram nenhuma dose ainda devem ser vacinadas sim, em qualquer época da gestação, porque estamos vendo uma evolução mais grave da covid-19 entre as gestantes”, acrescenta Lorena.
Em relação à vacina da Pfizer, o pediatra Juarez Cunha, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), destacou durante o fórum, que os achados preliminares não mostraram sinais de risco na segurança entre as gestantes que receberam a vacina. Além da CoronaVac, o Ministério da Saúde recomenda a Pfizer para grávidas.
Sobre a intercambialidade entre as vacinas da AstraZeneca e da Pfizer adotada no Rio de Janeiro, Lorena ressalta que não há dados robustos que comprovem sua eficácia. “Já existem alguns trabalhos que falam de benefícios sobre a vacinação feita com a primeira dose da AstraZeneca e a segunda da Pfizer, fazendo com que elevasse a eficácia do esquema de vacinação, mas isso é um estudo único ainda, não temos dados robustos para fundamentar, principalmente em relação à população de gestantes”, afirma.
A imunologista não considera arriscada a mistura das vacinas entre as grávidas, mas ressalta que a eficácia da vacinação desta forma só poderá ser atestada a longo prazo. “Não vejo o risco aumentado de evento adverso, ou de não eficácia, alguma eficácia vai ter e pode ser que seja até melhor, mas nós ainda não sabemos ao certo”, afirma.
O pediatra infectologista Marco Aurélio Safadi, presidente do Departamento de Infectologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) chama a atenção sobre o que se sabe sobre o período de imunidade oferecido pelas vacinas. “Infelizmente, ainda não sabemos por quanto tempo o indivíduo se mantém protegido. E a gente sabe que essa proteção não pode ser mensurada só com dosagem de anticorpos neutralizantes. Os alicerces que norteiam a proteção vão muito além apenas dos anticorpos neutralizantes. Então, tem uma série de outros elementos para contribuir para isso. […]”, disse durante o fórum.
“Aparentemente, boa parte dessas vacinas mostraram que essa proteção se manteve relativamente sólida 6 meses após a vacinação. […] É a experiência da própria proteção fruto da infecção: os indivíduos que tiveram a doença, por pelo menos 6 meses, eles atingem um grau de proteção muito alto. É muito improvável a reinfecção dentro de 6 meses”, completou.
Vacina da Johnson
Assim como a vacina da AstraZeneca, a da Johnson também é fabricada por meio de vetor viral não replicante, tecnologia que tem sido associada aos eventos adversos envolvendo a formação de coágulos sanguíneos após a vacinação com os imunizantes.
Por este motivo, Lorena acredita que o Ministério da Saúde deve manter a mesma recomendação em relação às gestantes. “Como a da Johnson também é uma vacina de vetor viral, até então também não está recomendada para elas”, afirma.
Até o fechamento desta matéria, a pasta ainda não havia se posicionado sobre o uso da vacina da Johnson em grávidas.
Por: R7