Indígena escoltado por ameaças é encontrado morto no Pará A polícia federal do Pará está investigando a morte do líder indígena Tymbektodem
Indígena escoltado por ameaças é encontrado morto no Pará
A polícia federal do Pará está investigando a morte do líder indígena Tymbektodem Arara na Terra Indígena Cachoeira Seca, a 250 km de Altamira.
Como era conhecido, Tymbek foi encontrado morto em um rio em 14 de outubro. Isso foi supostamente o resultado de afogamento, apenas 16 dias depois de ele se dirigir à Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, na Suíça, para denunciar uma invasão de terras na TI Cachoeira Seca, onde vivem pessoas de etnia Arara.
Na ocasião, ele discursou durante a sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Tymbek era o linguista dos Arara, etnia de contato recente com não-indígenas.
“Somos um povo de contato inicial, viemos aqui para exigir que se respeite nossa vida e nosso território. Sofremos muitas invasões. A demarcação só ocorreu 30 anos depois do contato com os não indígenas, em 2016”, discursou o indígena.
A área habitada pelos Arara é alvo de atividades predatórias com o objetivo de coletar madeira. Entre 2007 e 2022, 697 km2 de floresta na TI Cachoeira Seca foi destruída, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Enquanto esteve em Genebra, na ONU, Tymbek recebeu áudios atribuídos a fazendeiros locais, segundo uma pessoa que o acompanhou.
“Tanto ele quanto o cacique receberam áudios, nenhum dizendo ‘Vou te matar’, mas ‘Ah, você está aí? Que bom que está defendendo sua terra’. ‘Vocês não têm medo?’, ‘O que estão fazendo aí?’ E eles ficavam dando perdido, dizendo que era para apresentar a cultura Arara”, relata uma pessoa que esteve com Tymbek na ONU.
Ao voltar ao Brasil, a Força Nacional fez a escolta de Tymbek e do cacique Arara desde o desembarque no Pará até a chegada na aldeia. Depois, os agentes foram embora. A liderança morreu cerca de dois dias depois.
O Ministério da Justiça e da Segurança Pública, responsável pela Força Nacional e administrado pelo ministro Flávio Dino, que confirmou ter feito a escolta de Tymbek a pedido da Funai de 2 a 7 de outubro.
“As atuações têm caráter consensual e subsidiário, sendo desenvolvidas sob a coordenação e conforme planejamento dos órgãos demandantes. Nesse contexto, é importante frisar que o emprego da Força Nacional na escolta de lideranças indígenas daquela região, dentre essas, do senhor Tymbektodem Arara, ocorreu especificamente no período de 2 a 7 de outubro de 2023, em apoio à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) […] sem intercorrências“, diz o Ministério da Justiça, em nota.
A assessoria de imprensa da Polícia Federal do Pará confirmou que a investigação está em andamento, mas que a corporação “não comenta investigações em andamento”.
Versões diferentes para o afogamento
Tymbek estava em um barco no Rio Iriri com dois ribeirinhos locais. Após beber um pouco de cachaça, eles voltaram para a aldeia indígena, que fica próxima a uma vila de pessoas não indígenas dentro da TI.
De acordo com os indigenistas, o abuso do álcool é um dos problemas que os não-indígenas levam às aldeias, especialmente aqueles que se mudaram recentemente. Em 1987, os Arara mudaram-se para fora da aldeia, mas a TI Cachoeira Seca foi autorizada apenas em 2016.
Há duas versões para a morte: uma diz que Tymbek estava em um barco se jogou por conta própria no rio para nadar e não saiu mais da água, com os ribeirinhos tentando salvá-lo. Outra aponta que o indígena foi jogado do barco por eles e, por estar bêbado, não conseguiu nadar e se afogou.
Relatos documentos pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), vinculado ao SUS e ao Ministério da Saúde, detalham que houve procura à noite no local em que Tymbek caiu. Porém, o corpo só foi encontrado na manhã do dia seguinte.
“O corpo estava no exato local onde ele pulou da rabeta (um tipo de embarcação que se assemelha a uma canoa motorizada), a uns 800 metros da margem, em posição vertical (em pé)”, detalha o relato do DSEI.
Após ser retirado do rio, o corpo da liderança Arara foi levado à Comunidade Maribel, dos não-indígenas e local onde os barcos maiores e veículos conseguem chegar.
Após permanecer lá por cinco horas sob a luz do sol, foi transportado em um saco para a cidade de Altamira por uma caminhonete da Polícia Civil do Pará.
Mesmo duas semanas depois da morte de Tymbek, a Polícia Federal de Altamira, que supervisiona a investigação, não esteve no local da morte, segundo especialistas que protegem os indígenas Arara.
Povo Arara sob risco
A estimativa das lideranças Arara é de que há em torno de 2 mil invasores na região. Em comparação, os indígenas que convivem no local não passam de 200. Eles alegam que um dos motivos para a permanência de não-indígenas no local foi a instalação da hidrelétrica de Belo Monte.
Um indigenista que atuam junto ao povo Arara indica que há desmatamento no local para obter madeira do tipo ipê. Indígena escoltado por ameaças é encontrado
Tymbek era o linguista oficial da etnia e costumava representá-la em eventos em Brasília, como contra o marco temporal para demarcação de terras indígenas e denúncias na ONU.
“Os Arara não têm muito idosos, eram alguns mais velhos e logo vinha o cacique e o Tymbek, também quem se comunicava com o mundo de fora. Histórias vão se perder e quem vai defendê-los?”, disse um indigenista. “Eles [indígenas Arara] são coagidos de alguma maneira: perdem a terra e o invasor oferece gado, carne, whisky… É uma violência permeada por esse jeito sujo de relação”.
AliançA FM